terça-feira, 31 de julho de 2018

Resenha #1: O Morro dos Ventos Uivantes - Emily Brontë


Vendo o tempo em que deixei esse site abandonado é que percebo como o hábito da escrita não acadêmica se dissipou da minha rotina. Nem sei se ainda sei escrever com o entusiasmo de antes, mesmo vendo como as coisas que falava aqui eram meio “juvenis”. É engraçado. Ligar o computador e abrir o word para escrever esse texto de agora parece algo totalmente novo. Foi puro entusiasmo e eu não poderia deixar passar.

O que me trouxe aqui segurando pelas minhas orelhas e deixando-as quentes como brasa, foi a obra da autora Emily Brontë, de 1847, O Morro dos Ventos Uivantes.

As “orelhas quentes” não foram figuras de linguagem. Eu, realmente, fiquei muito perplexa lendo esse livro, de um jeito que não achei que fosse ficar lendo qualquer outro. Terminei de lê-lo em uma semana, e minhas orelhas realmente ficaram quentes, se não de perplexidade, de raiva.

Creio que meu maior erro tenha sido iniciar essa leitura sem pretensão nenhuma, como se fosse mais um romance clássico, agradável, com mocinhos e mocinhas como personagens principais. E com O Morro dos Ventos Uivantes tudo mudou. Esse livro me trouxe questionamentos e sentimentos conflitantes. Foi o primeiro livro que me fez chorar, não de emoção, mas num misto de raiva e desespero. Eu tenho que falar dele.

A obra conta a história de um amor que chega a ser mais forte que a morte, mas, para mim, é principalmente, sobre vingança.

O que, primeiramente, me chamou a atenção, foi como a obra consegue te transportar para o ambiente, sentir o que os personagens sentem e quase que viver a história. A riqueza de detalhes é impressionante.

As emoções são em doses exageradas: amor, ódio, vingança. É uma coisa tão intensa, que até os descendentes sofrem os impactos da paixão de Heathclif e Catherine. O que, certamente, me deixou mais consternada.

Na verdade, não sei dizer para vocês se amei ou se odiei o livro. Falo isso, pois, ele me parece muito um “ame ou odeie”. Eu permaneci sem saber durante toda a leitura.

A história é densa, os personagens são intragáveis. Foram diversos os pensamentos que me foram provocados.

A narrativa da história dos personagens principais é realizada por Ellen Dean, que inicia sua história nos apresentando os verdadeiros donos do Morro: a família Earnshaw, para quem ela trabalhou desde a juventude. A vida dessa família muda completamente quando, um dia, voltando de uma viagem, o Sr. Earnshaw retorna com um menino no colo. Eles o batizaram como Heatchcliff. Heatchcliff era uma criança desprovida de amor, o que, para alguns, será a explicação da causa das tantas maldades que ele irá provocar ao longo de sua vida. Rapidamente Heatchcliff e Catherine, sua irmã adotiva, desenvolvem uma amizade forte que, mais tarde, vai dar espaço ao nascimento de um amor tão forte quanto. Mas, Hindley Earnshaw, irmão mais velho de Catherine, nunca simpatizou com o menino que atraía todas as atenções de seu pai.

Com a morte do Sr. Earnshaw a vida de Heatchcliff muda ao ser tratado como um simples criado. Ele vai passar a sofrer muitas humilhações e privações, o que só vai contribuir para o aumento do ódio que ele carregava no peito. O motivo para ele ainda conseguir aguentar aquela situação e fazer tentá-lo reprimir os sentimentos tenebrosos de seu coração era Catherine, que começa a passar mais tempo com os filhos dos Lintons, proprietários de Trushcross Grange: Edgar e Isabela Linton.

Catherine decide se casar com Edgar, apesar de amar Heatchcliff. É essa atitude a gota d’água para o rapaz que vai embora daquelas terras, permanecendo distante por três anos. Ouso dizer que esses foram os anos mais tranquilos para os Lintons porque passado esse período Heatchcliff retorna como um verdadeiro cavalheiro e com um único objetivo: vingança. Se vingar de Hindley por tudo que ele o fez passar; se vingar de Edgar, por lhe ter roubado seu amor, e, por que não, se vingar também de Catherine que escolheu ter status e conforto a viver ao seu lado?

A vingança de Heatchcliff o domina e coisas terríveis acontecem. Vamos acompanhar o que o ser humano é capaz de fazer quando não alimenta o amor em seu ser e quais são as consequências de no lugar de alimentar o amor, se alimentar de vingança, raiva, egoísmo e tantos outros sentimentos ruins.

Vocês conseguem perceber o quão denso é esse livro? Além dos acontecimentos serem terríveis, a narrativa forte e descritiva da autora potencializa os sentimentos e caráter dos personagens, como destacado abaixo na fala de Catherine:

Minhas infelicidades neste mundo têm sido as infelicidades de Heatchcliff. Aguardei-as e senti-as todas desde sua origem. É ele a minha grande razão de viver. Se tudo morresse, mas ele ficasse, eu continuaria a existir. E, se tudo permanecesse e ele fosse aniquilado, o mundo inteiro se tornaria para mim uma coisa totalmente estranha. Eu não seria mais parte desse mundo”.

E é por isso que muitas pessoas odeiam esse livro. A parcela que ama O Morro dos Ventos Uivantes é aquela que considera lindo o amor entre Catherine e Heatchcliff, e que o mesmo só faz tudo o que faz por ter sofrido tanto na vida sem nunca ter alguém como modelo de bondade a ser seguido. E é aí que as minhas reflexões começam porque eu não consegui ver nenhuma beleza no amor entre os dois, muito pelo contrário. Eu vi algo doentio, que causava destruição a tudo que estivesse em volta. Por outro lado, é inevitável pensar que se Heatchcliff tivesse, por exemplo, recebido o amor de Catherine, o rumo das coisas teria sido completamente diferente. O que, não vou mentir, não me impediu de sentir nada mais do que raiva pela personagem. Mas, principalmente, por Catherine, uma personagem extremamente egoísta e impulsiva. Jamais permite que suas vontades sejam contrariadas. Mas realmente ama Heathcliff. Ama, como ela mesma diz, como ama a si mesma.

O ponto que eu desejo chegar é: podemos justificar totalmente e exclusivamente as atitudes de Heatchcliff nos baseando no passado e dificuldade que ele sofreu? Pra mim ele não é um “coitado”. E penso isso, pois, a autora, incrivelmente, nos deu essa chance ao nos mostrar como Hareton (filho de Hindley), fruto, também, da insanidade do pai e ao mesmo tempo da vingança de Heatchcliff, que inclusive o faz amá-lo como um pai, quando na verdade tomou tudo que era seu. Hareton foi privado de amor, viveu em um ambiente completamente conturbado, cresceu como um espelho de Heatchcliff, porém despertou em mim um sentimento de compaixão desde o princípio, diferentemente do personagem principal.

Não sei se consegui me fazer clara, falar sobre esse livro é muito difícil. É tão complexo e dá abertura para tantos questionamentos que fica complicado. O anti-herói, Heathcliff, realmente é uma vítima digna de dó ou um maluco inconsequente? Como distinguir os "bons" e os "malvados"? Como classificar uma história que não se insere dentro do formato do romantismo piegas?

Minha certeza é que cada pessoa que ler O Morro dos Ventos Uivantes terá uma visão diferente. Esse livro, realmente, mexeu comigo, me fez pensar, refletir. Eu amei a história? Não. Apesar de ter gostado de seu desfecho. Isso até me deixou angustiada, pois fiquei achando que minha leitura tivesse sido pobre e eu fosse mais uma leitora que só quer um romance piegas. Mas eu fiquei muito admirada com a percepção das variações da personalidade humana que Emily Bronte nos apresenta nesse livro.